Ipatinga, 9 de setembro de 2012.
De: Mutirão pela Ética e Cidadania
Para: Ministério da Saúde
A/C: Dr. Alexandre Padilha
Assunto: Breve Análise da Saúde Pública no Vale do Aço e manifesto em defesa do SUS
Excelentíssimo Ministro da Saúde,
MANIFESTO EM DEFESA DO SUS – IPATINGA - MG
Antes de relatarmos o debate e deliberação ocorridos na última reunião do Conselho Municipal de Saúde (CMS) no município de Ipatinga, que aconteceu dia 3 de setembro de 2012, é necessário retomarmos alguns fatos.
O Diário Oficial do município, do dia 30 de março, publicou um edital que convocava as entidades filantrópicas e organizações sociais (OS), que tinham como objeto em seus estatutos a prestação de serviços na área de saúde, para efetuarem ou atualizarem os seus cadastros junto ao setor de protocolo da Secretaria de Administração do município, visando a habilitação destas entidades para prestação de serviços na área da saúde, como gestão de hospital, policlínicas, postos de saúde, assessoria, consultoria, diagnóstico e capacitação no âmbito da secretaria municipal de saúde.
Assim sendo, neste dia o atual governo municipal oficializava o seu interesse em TERCEIRIZAR os serviços de saúde, demonstrando, também, o desrespeito à Constituição Federal que, em seu artigo 198 afirma que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo;
II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III - participação da comunidade.
O desrespeito à Constituição Federal caracterizou-se pelo fato dessa proposta não ter sido colocada para apreciação e deliberação do Conselho Municipal de Saúde. Esta atitude também é um desrespeito à Lei Nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, que dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde.
Sempre é bom lembrar que, o Conselho de Saúde é um órgão colegiado, de caráter permanente e deliberativo, composto por representantes do governo, prestadores de serviços, profissionais de saúde e usuários e atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo. Portanto, jamais o Poder Executivo Municipal poderia ter publicado um edital como este sem discutir com o Conselho Municipal de Saúde.
Assim que alguns conselheiros tiveram conhecimento do fato oficializaram junto à Secretaria Municipal de Saúde uma solicitação de esclarecimento, e em reunião extraordinária do Conselho Municipal de Saúde os conselheiros deliberaram pelo cancelamento do edital do dia 30 de março de 2012. Os argumentos apresentados pelo gestor municipal de saúde eram que o edital tratava-se somente do cadastro das organizações que demonstrassem o interesse em participar do processo que ainda não seria o processo de contrato de gestão propriamente dito. Mesmo com a deliberação do Conselho Municipal de Saúde o referido edital não foi cancelado.
Representantes da sociedade civil, também, apresentaram representação ao Ministério Público devido a inconstitucionalidade do conteúdo do edital.
Em outra reunião do Conselho Municipal de Saúde, representantes da Secretaria Municipal de Saúde apresentaram dificuldade de gestão do Hospital Municipal Eliane Martins (HMEM) devido a sua abrangência regional, o alto custo de sua manutenção, a queda na arrecadação municipal e a falta de repasses do governo estadual e federal para custeio do mesmo. Nesta reunião foi apresentada pelo diretor do Hospital Municipal que caso não houvesse financiamento externo a manutenção do Hospital estaria prejudicada, correndo o risco de fechamento.
Em julho do corrente ano, em cumprimento a um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) firmado entre o Ministério Público e a Prefeitura Municipal de Ipatinga, foram exonerados dezenas de servidores que tinham contratos irregulares (sem concurso público) e prestavam serviços no Hospital Municipal Eliane Martins (HMEM). Com a redução do quadro de pessoal e com a determinação do atual governo municipal em impedir a realização de horas extras (que ocorriam em função da falta de pessoal) houve a redução de leitos hospitalares e restrição ao atendimento de pacientes no Pronto Atendimento do Hospital Municipal Eliane Martins para pacientes classificados com urgência e emergência, conforme o Protocolo de Manchester.
O Conselho Municipal de Saúde vem debatendo a situação e solicitando que a Secretaria Municipal de Saúde apresente alternativas para a resolução dos problemas, principalmente, por manter desde 2010 a contratação de uma consultoria que tem como objeto do contrato a “reestruturação do sistema da rede municipal de saúde através do planejamento estratégico”. E que até hoje não foi apresentado nenhum estudo desta consultoria para o Conselho Municipal de Saúde.
Outro fato constatado e debatido no Conselho Municipal de Saúde foi a ineficácia da atenção primária e da atenção secundária em Ipatinga e nos demais municípios da região.
O Conselho Municipal de Saúde debateu e deliberou sobre os fatos, sugerindo a realização de um seminário regional para discutir e propor ações referentes à atenção integral à saúde; propôs ainda a convocação dos profissionais aprovados em concurso público realizado recentemente para a substituição dos servidores exonerados e recomposição do quadro de pessoal necessário e propôs a readequação do fluxo do Hospital Municipal. A resposta em relação à convocação dos profissionais aprovados em concurso público, que resolveriam boa parte da demanda da atenção básica e consequente descongestionamento do pronto atendimento do Hospital Municipal com atendimentos ambulatoriais, não foi obtida pelo Conselho Municipal de Saúde até a presente data.
O Secretário Municipal de Saúde vem relatando que está buscando apoio junto ao Governo Estadual e que este afirmou que fará um repasse de recursos financeiros ao município após o período eleitoral. Mas até agora, não foram apresentadas informações concretas em relação a essa negociação.
No dia 29 de agosto, o Ministério Público Estadual convocou uma reunião com os secretários municipais de saúde da região do Vale do Aço e com os gestores das entidades mantenedoras dos hospitais privados para discutir os problemas da política de saúde regional.
O promotor Gilmar Assis, integrante da coordenação estadual do Ministério Público, conduziu os trabalhos e os debates. O encontro foi denominado de “Regulação Sanitária” e serviu para que municípios, Estado e representante da União pudessem avaliar a situação dos hospitais públicos e privados, e ainda discutir as demandas que deveriam ser atendidas nas unidades de saúde.
As propostas apontadas foram reestruturação da atenção básica, criação de fluxos e protocolos, bem como a referência e contra referência. No que tange em especial a crise no Hospital Municipal Eliane Martins a solução proposta foi a regionalização do mesmo. Proposição feita pelo representante do Estado, que também apresentou as experiências que têm vivenciado em Minas Gerais.
Como encaminhamento deste encontro definiu-se que seria agendada uma reunião ampliada da Microrregião de Coronel Fabriciano e da Microrregião de Ipatinga, convocada pela Superintendência Regional de Saúde de Coronel Fabriciano, quando debaterá a atenção primária e secundária da política de saúde.
Outro encaminhamento dado foi o agendamento da reunião da CIB regional para dia 6/9/2012, quando o gestor municipal da saúde de Ipatinga deverá apresentar deliberação do Conselho Municipal de Saúde sobre o processo de regionalização.
Para discutir a deliberação do Conselho Municipal de Saúde sobre a regionalização do Hospital Municipal Eliane Martins realizou-se uma reunião extraordinária do Conselho, no dia 03/9/2012, quando o Secretário Municipal de Saúde, apresentou a proposta de regionalização, porém não apresentou nenhum planejamento. Nessa reunião, os conselheiros municipais de saúde e representantes de outros movimentos sociais solicitaram os seguintes esclarecimentos:
1. Em que momento a administração detectou que não haveria possibilidade de manter o Hospital Municipal Eliane Martins?
2. Qual foi a resposta do governo do Estado de Minas Gerais às solicitações de recurso para enfrentar a crise da saúde em Ipatinga?
3. O Hospital Municipal Eliane Martins tem como funcionar como está até o final do ano de 2012?
4. Quanto custa o Hospital Municipal Eliane Martins hoje para Ipatinga e quanto vai custar o hospital regional? Apresente detalhadamente a prestação de contas do Hospital Municipal (custo/assistência e a proposta para regionalização).
5. O que pode ser feito para manter o Hospital Municipal Eliane Martins aberto até o final do ano de 2012?
6. Qual a previsão de financiamento do Estado para o hospital regional?
7. Esta transferência pode ocorrer no período eleitoral?
8. Se não, como fica a manutenção das atividades do Hospital Municipal até 07 de janeiro de 2012?
9. Quais as justificativas para a regionalização ocorrer neste momento?
10. Quais os passos e trâmites legais para a concretização da regionalização?
11. Qual o cronograma proposto para a implantação da regionalização?
12. Quem vai administrar o hospital regional?
13. Quais as opções de gestão? Qual opção a administração municipal atual defende e por quê?
14. Caso seja administrado por uma organização social (OS) ou fundação como será o contrato de gestão e/ou termo de parcerias?
15. Qual é o interesse de um grupo privado em assumir a gestão de um serviço público que não seja o interesse econômico?
16. Como será feita a prestação de serviços do hospital regional?
17. O que será feito em relação aos trabalhadores do hospital municipal?
18. Como será feita a contratação de pessoal para o hospital regional?
19. Como os usuários do serviço público de saúde poderão reclamar a uma entidade privada a não execução de um serviço e a negação de um direito?
20. Como pode o poder público abrir mão de executar o que lhe e próprio e essencial: a prestação de serviços públicos?
21. A Constituição e a Lei Orgânica da Saúde admitem a prestação dos serviços privados de saúde de forma complementar ao SUS e não substitutiva a serviços ou órgãos do SUS. Qual o seu posicionamento enquanto gestor do SUS de Ipatinga diante desta proposta de regionalização com a hipótese de terceirização?
22. Como o Conselho Municipal de Saúde irá controlar o conjunto das ações do hospital regional?
23. Qual será o Conselho Municipal de Saúde que iria controlar e deliberar sobre o hospital regional (CMS – Ipatinga, CMS- Cel. Fabriciano, CMS- Timóteo)?
24. Qual será a participação do Conselho Municipal de Saúde, do Estado e do Ministério da Saúde na elaboração da proposta e na implementação da regionalização do hospital?
25. O Conselho Municipal de Saúde apresentou a seguinte defesa:
26. A regionalização como processo de fortalecimento do SUS, como um sistema universal, com a gestão 100% pública. Portanto, um sistema único e com comando único, deixando claro que é contra a TERCEIRIZAÇÃO da gestão e a favor de um CONTROLE SOCIAL AMPLO.
Após estes questionamentos, que não foram respondidos, e dos posicionamentos dos conselheiros municipais de saúde, foram apresentadas duas propostas para apreciação e votação da plenária.
PROPOSTA 1- REGIONALIZAÇÃO SEM TERCEIRIZAÇÃO DA ASSISTÊNCIA.
PROPOSTA 2- DEBATER AMPLAMENTE COM A COMUNIDADE LOCAL E REGIONAL OS TERMOS DA REGIONALIZAÇÃO, PARA POSTERIORMENTE DELIBERAR SOBRE A REGIONALIZAÇÃO.
A deliberação do Conselho Municipal de Saúde de Ipatinga foi pela PROPOSTA 02.
Ainda nesta reunião, foi deliberado que a decisão do Conselho Municipal de Saúde será oficializada à Comissão Intergestores Bipartite (CIB), no dia 06/09/2012, por uma comissão formada por representantes do conselho.
Diante disso, solicitamos o apoio de todos em defesa do SUS.
Somos a favor da regionalização e defendemos o financiamento de recursos públicos para órgãos públicos!
MUTIRÃO PELA ÉTICA E CIDADANIA
Coletivo Ipatinga
Coordenadores:
Marcio Rodrigues de Castro, Médico
Especialista em Clinica Médica, Infectologia e MBA Gestão de Saúde
Marilene Tuler, Historiadora e Educadora
Mestre em História Social e autora das obras Massacre de Ipatinga: Mitos e Verdades e REINVENTANDO A UTOPIA: a Caminhada dos Franciscanos no Vale do Aço.
*Enviado pela companheira Juliana Zimmermann
**Povo do "Mutirão", desculpem-nos por demorarmos em fazer nossa parte na divulgação do documento. Esperamos que ainda seja de alguma valia. Abraços a tod@s
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