Jornal da Adufrj - edição 785 - 28/01/2013
Republicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 04/02/2013
Procurador federal do Ministério Público do Trabalho critica o assédio do governo sobre as universidades para implantação da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) na gestão dos HUs
Por Elisa Monteiro
O procurador federal Eduardo Varandas (Foto: Adufrj) |
Eduardo Varandas Araruna, procurador federal do Ministério Público do Trabalho na Paraíba, acompanha o andamento da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) nas duas universidades federais daquele estado: a Universidade Federal da Paraíba (UFPB), com sede em João Pessoa, e a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).
“A ideia que se tem é de que se criou um 'super-ser' com potencial para resolver todos os problemas dos hospitais universitários. Algo capaz de transformá-los em algo de primeiríssimo mundo, avançadíssimo. E a gente sabe que a médio e longo prazo isso não acontecerá”, analisa.
Varandas participou de uma reunião da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde, na Uerj, nos dias 19 e 20, quando foi entrevistado pelo Jornal da Adufrj.
Segundo ele, nas duas federais de seu estado “há tanto por parte da reitoria, quanto por parte da direção dos hospitais universitários o argumento de que não há opção para os HU [Hospitais Universitários]”. Para o procurador, a abordagem do governo federal sobre essas unidades “viola a autonomia universitária”. Varandas destaca que o temor dos dirigentes é que haja uma extrema desigualdade entre as unidades de Saúde: de um lado, os HUs que aderirem à Ebserh “aquinhoados” (providos), de outro, hospitais quase abandonados. “Isso é um terrorismo social”, critica. “Dizer que você pode tomar a decisão, mas arcará com as piores consequências se não aceitar, não é, de fato, uma opção. É uma ameaça. É o que chamamos de assédio”, completou. Afirmou ainda: “O que eu vejo, na verdade, é um processo de permissividade, de submissão, das universidades às ordens emanadas do Poder Executivo federal”.
Veja a entrevista:
A lei que criou a Ebserh é vulnerável do ponto de vista constitucional?
Quem vai dar a última palavra sobre a constitucionalidade da Ebserh é o Supremo. Mas eu entendo que sim, a lei é vulnerável em diversos pontos. Em primeiro lugar, ela cria uma pessoa jurídica de direito privado para prestar uma atividade essencial de utilidade pública. Isso é uma anomalia.
Em segundo lugar, entendo que a lei que criou a Ebserh viola a universalidade da Saúde. A natureza jurídica da empresa pública retira o protagonismo do Estado tal como postulado pela Constituição. A figura da empresa pública foi concebida para situações em que o Estado entra na iniciativa privada por conveniência ou necessidade. É o caso da Caixa Econômica Federal, que tem fim lucrativo como qualquer outro banco. Não é o caso da Ebserh. Na prática, ela representa um início de privatização da saúde pública federal.
Depois, a Ebserh cria, dentro do HU, duas figuras constitucionais: o médico terceirizado celetista e o estatutário do quadro efetivo. Ou seja, duas atividades exatamente iguais com tratamentos jurídicos completamente diferenciados. Ainda que sendo uma empresa pública, a partir do momento que a Ebserh quebra a isonomia, ela rompe o paradigma de estrutura para a Saúde postulado na Constituição, que é o Sistema Único de Saúde. Esse é, para mim, o maior problema de ordem jurídica.
Há precedentes parecidos em julgamentos recentes do Supremo?
O Supremo Tribunal Federal já decidiu que uma Emenda à Constituição era inconstitucional porque autorizava a União, estados e municípios a contratarem pela CLT, exatamente sob o argumento de que quebrava o princípio da isonomia.
Quais são os desdobramentos possíveis da ação ajuizada pela Procuradoria-Geral da República, no início deste ano?
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) foi distribuída para o relator, o ministro Dias Toffoli. Na ação, existe um pedido de liminar, que é uma decisão imediata, dado o seu caráter emergencial. Caso a liminar seja concedida do jeito que está postulada pelo procurador-geral da República, a Ebserh teria suas as atividades suspensas. A questão será avaliada pelo Supremo Tribunal Federal agora, em fevereiro, quando o tribunal retorna do recesso.
O procurador-geral da República quer a suspensão imediata das atividades da Ebserh. Mas se a liminar for indeferida, não será uma decisão irrecorrível. O Ministério Público Federal poderá entrar com um recurso de agravo, requisitando que o tribunal inteiro reavalie a decisão do ministro Toffoli.
Caso a liminar seja denegada pelo tribunal, nada acontece, a ação prossegue, correndo normalmente e a Ebserh poderá se infiltrar em todos os hospitais universitários. Mas, se a liminar for acolhida, todos os atos da Ebserh, inclusive nas universidades que já firmaram contrato, ficam suspensas. A questão fica sobrestada [suspensa] até o julgamento da ADI.
E quanto tempo leva esse processo?
Havendo ou não suspensão, o processo dura em torno de quatro a oito anos. Depende da complexidade de cada caso, mas é a média. Entretanto, a meu ver, se a liminar não for concedida, o tempo vai sedimentar a Ebserh. Em quatro ou oito anos, haverá outra presidência e outras estruturas. Embora isso não sirva de argumento jurídico, eu vejo o tempo como um elemento desafiante.
Adesão na UFBA na mira do Ministério Público
O Ministério Público Federal (MPF) resolveu instaurar inquérito civil para “monitorar o processo e a forma de adesão da Universidade Federal da Bahia (UFBA) à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), bem como a sua contratualização e operacionalização dos serviços de gestão contratados, na perspectiva da tutela do Direito à Saúde e dos interesses da população usuária do Sistema Único de Saúde (SUS)”. A decisão foi publicada no Diário Oficial da União do último dia 18/01.
Na avaliação do Andes-SN, a ação do MPF na Bahia é uma vitória do movimento contra a privatização da Saúde Pública e em defesa da autonomia universitária. (Fonte: Andes-SN)
*Retirado da Adufrj
**Republicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 04/02/2013
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