segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Um estudo sobre a Saúde: a austeridade custa vidas humanas na Europa

Abr 16/2013
Republicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 05/08/2013

Por Dietmar Henning
Tradução para Revista Rubra por Carlos Pratas

Fonte: www.publico.es (Tradução da frase:
"O custo humano das políticas de
cortes: por que a austeridade mata")
Vastos setores da população europeia pagam com a sua saúde, senão com a sua vida, as medidas de austeridade ditadas pela União Europeia (UE). É esta a conclusão de um recente estudo publicado pela revista médica britânica The Lancet. As populações mais desfavorecidas são as da Grécia, de Espanha e de Portugal onde a UE impôs cortes sociais massivos.

Numerosos relatos da Grécia e de Espanha descrevem o desespero e a miséria da população devido a crise econômica: crianças desmaiam de fome nas escolas; os pais, forçados pela pobreza e pelo desespero, são obrigados a entregar os seus filhos aos centros de acolhimento; os reformados vasculham os caixotes de lixo à procura de comida; as pessoas gravemente doentes que perderam o direito, ao fim de um ano de desemprego, à assistência médica, recorrem aos hospitais tarde demais – e estão condenadas a morrer.

Um artigo recente do jornal alemão Süddeutsche Zeitung descreve também a situação catastrófica que existe na Grécia. Dado que os serviços de urgência dos hospitais só estão abertos quatro dias por semana, os doentes são obrigados a fazer, por isso, longos trajetos e a suportar longas filas de espera. “Todo aquele que subitamente sentir uma dor, sofra uma crise cardíaca ou um acidente vascular cerebral, tem que se informar para saber qual o serviço de urgência que está aberto”. Os doentes devem levar os seus próprios medicamentos, tesouras e tampões, que se encontram em falta nos estoques dos hospitais.


Os doentes estão geralmente sob os cuidados dos membros das suas famílias. Uma enfermeira ganha 1.000 euros numa semana de 60 horas. Um médico, chefe de serviço, terá declarado: “Neste momento, na Grécia, o desemprego é sinônimo de morte”. A taxa de desemprego é, oficialmente, de 26%, sendo de 60% para os jovens de menos de 24 anos.

No estudo publicado pelo The Lancet, o professor de Saúde Pública Martin Mckee tem analisado sistematicamente os efeitos da crise a partir de estudos e estatísticas nacionais, em colaboração com Marina Karanikolos do Observatório Europeu das Políticas e Sistemas de Saúde e Johan Mackenbach da Universidade de Rotterdam. Concluíram que as doenças infecciosas como a malária, a febre causada pelo vírus do Nilo Ocidental e a dengue, as infecções pelo HIV entre os toxicodependentes, a depressão e o suicídio aumentaram consideravelmente.

Enquanto o número de suicídios de pessoas com menos de 65 anos baixou regularmente na Europa até 2007, antes da crise financeira, depois dessa data aumentou significativamente. Este aumento corresponde ao aumento do desemprego e da pobreza. Na Inglaterra, o estudo constata que o aumento “significativo” da taxa de suicídio entre 2008 e 2010 está diretamente ligado ao aumento do desemprego e é responsável por 1.000 mortes a mais. 

O ministério grego da Saúde assinalou um aumento de 40% da taxa de suicídio entre Janeiro e Maio de 2011 em relação ao período homólogo do ano anterior.

Os transtornos mentais aumentaram substancialmente em Espanha de 2006 a 2010, incluindo a ansiedade, os distúrbios psicossomáticos e a depressão. Estas doenças registaram um aumento considerável. Pelo menos metade dos transtornos mentais é devido ao desemprego súbito e à dificuldade que essa situação provoca no pagamento das hipotecas e das rendas. 

Em Portugal, o balanço das vítimas com mais de 75 anos no inverno de 2012 aumentou 10% em comparação com o ano anterior. Mais de 40% dos reformados que vivem sozinhos não têm condições para aquecerem adequadamente as suas casas devido aos cortes nos direitos sociais.

Fonte: andradetalis.wordpress.com
O estudo do The Lancet atribui claramente esta responsabilidade às medidas de austeridade exigidas pela “troika”, que envolve a União Europeia, o Banco Central Europeu (BCE) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), como contrapartida do “plano de resgate financeiro” para os países da Europa do Sul.

A troika, por exemplo, exigiu que a Grécia não gastasse mais de 6% do PIB em cuidados de Saúde, “criando um precedente para a União Europeia no que respeita ao controle dos sistemas nacionais de Saúde de alguns países”. Depois dos cinco planos de austeridade terem arrastado o país, mais profundamente, para a recessão, o PIB não parou de cair, reduzindo também o montante das despesas com a Saúde. Em 2009, as despesas com Saúde atingiram 14 mil milhões de euros; no ano anterior, contudo, não tinham sido estimadas em mais de 9,5 mil milhões de euros.

Em Portugal, a troika exigiu cortes de 670 milhões de euros só na rubrica da Saúde.

Em Espanha, em Portugal e na Grécia, numerosas instituições de Saúde foram encerradas, camas de hospitais suprimidas e as taxas moderadoras cobradas aos doentes para os medicamentos mais do que duplicou.

Em Abril de 2012, em Espanha, uma nova lei entrou em vigor através de um decreto real – ignorando o parlamento – e que torna agora o sistema “universal” de cuidados de Saúde dependente do emprego. A consequência é que centenas de milhares de imigrantes sem documentação ficam praticamente impedidos de acessar os serviços de Saúde.

É devido os fundos destinados à prevenção terem sido drasticamente reduzidos que, depois de 2011, se deu um aumento significativo das infecções por HIV entre os toxicodependentes na Grécia. Entre 2007 e 2010, 10 a 15 pessoas* foram infectadas, anualmente, pelo vírus; em 2011, contudo, esse número passou para 256 e, durante os oito primeiros meses de 2012, foram 314 as pessoas infectadas. A causa desta situação prende-se com o fato das seringas terem deixado de ser distribuídas aos toxicodependentes em virtude das restrições impostas pelos cortes. Para aqueles que são afetados por estes cortes, é uma sentença de morte.

Mckee, um dos autores do estudo, sublinhou que os dirigentes políticos europeus têm, obstinadamente, negado até agora esses efeitos da crise. Comparou a atitude da Comissão Europeia e dos governos da UE com a tática de dissimulação usada pela indústria do tabaco. “As vozes da Saúde Pública têm estado totalmente ausentes dos debates sobre a melhor maneira de responder à situação. Muitos ministérios da Saúde permanecem silenciosos. A Direção Geral de Saúde e dos Consumidores da Comissão Europeia, não obstante a sua obrigação de avaliar os efeitos da política da UE sobre a Saúde, não avaliou os efeitos da política de austeridade da troika; ou melhor, limitou-se a dar conselhos sobre o modo como os ministérios da Saúde deveriam reduzir os seus orçamentos”.

Os investigadores, dirigidos por Mckee responsabilizam, muito justamente, a troika pela austeridade europeia. Não citam nenhum nome. No entanto, no seio da troika – e particularmente na UE e no BCE – é o governo alemão, conduzido pela chanceler Angela Merkel e o ministro das finanças Wolfgang Schäuble (os dois, membros da União Democrata Cristã - CDU), o verdadeiro motor dessa estratégia.

Hoje, sete décadas depois dos tanques alemães terem semeado a destruição por toda a Europa, um governo alemão causa o sofrimento e a miséria de todo um continente a uma escala nunca vista, excetuando os períodos de guerra, e isto em nome da “estabilidade” e do “resgate da União Europeia”. As medidas de austeridade impostas por Merkel e Schäuble, saudadas como um sucesso, significam pobreza, miséria, desespero e morte para milhares de pessoas. Segundo este estudo, são particularmente as crianças as principais vítimas.

Mais: o governo Merkel só tem condições de impor tão implacavelmente a sua política reacionária porque todos os partidos do establishment a apoiam explícita ou tacitamente. Quer sejam conservadores ou social-democratas, todos os governos europeus estão de acordo que a população europeia pague os milhares de milhões de euros que foram postos à disposição dos bancos. Os partidos de oposição da pseudo esquerda, como o partido A Esquerda (Die Linke) na Alemanha, o Novo Partido Anticapitalista (NPA) em França e o SYRIZA na Grécia, defendem a UE e dão cobertura a esta contra-revolução social.

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*Retirado da Revista Rubra
**Republicado no blog da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde em 05/08/2013

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