Manifesto em Defesa do Hospital das Clínicas - UFPE
Pernambuco, Novembro de 2013
As notícias sobre o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuci (UFPE), veiculadas na imprensa local este ano, nos desafiam a entender o que ocorre com os hospitais universitários do país e a encontrar saídas para os seus problemas.
A EBSERH (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares) tem sido apresentada como a única saída positiva para os hospitais. Na verdade, ela é simplesmente uma solução de mercado que abate a autonomia das universidades e constroi uma política em que os hospitais são considerados igualmente a empresas. Assim, os custos são mais importantes do que a própria Saúde, a Pesquisa, o Ensino e a Extensão.
Subscrevemos este manifesto para a sociedade pernambucana na busca de somarmos esforços e encontrarmos saídas justas, nas quais os interesses da população e da Universidade sejam de fato centrais nas tomadas de decisão sobre os rumos do Hospital das Clínicas.
Em defesa da Saúde Pública e o papel autônomo da Universidade
O país viveu, em junho deste ano (2013), uma mobilização social ímpar. A juventude denunciava com veemência os serviços públicos sucateados, ao mesmo tempo em que os governos corriam para atender às exigências da FIFA para a Copa do Mundo. Essa contradição não é de hoje, vem se repetindo num processo de acumulação de capital fortíssimo nos chamados BRICS, e o Brasil é um deles: é a sétima economia mundial com a terceira pior distribuição de renda do mundo!
A Auditoria Cidadã revela, mais uma vez, que esse clamor não demoveu os grandes interesses no enfrentamento dos problemas encontrados nos serviços públicos. “O governo federal enviou ao Congresso Nacional a previsão orçamentária para 2014 com a impressionante destinação de R$ 1,002 trilhão de reais para o pagamento de juros e amortizações da dívida, sacrificando todas as demais rubricas orçamentárias” [1]. Esse valor é simplesmente 42,42% do total do orçamento nacional!
A questão do Hospital das Clínicas da UFPE (e dos Hospitais Universitários brasileiros em geral) não foge a esse contexto. A população clama por mais acesso a hospitais de qualidade, a profissionais da Saúde que atendam devidamente o povo, entre outras reivindicações. Responder a esses anseios implica ter uma política de Estado de forma profunda e permanente com o fortalecimento do Sistema Único de Saúde - SUS, com a definição de uma carreira para os trabalhadores da Saúde, com um revigoramento dos Hospitais Universitários para atender a pesquisa e a formação de profissionais.
Os fatos consumados e as políticas "salvíficas" do mercado
Nos últimos tempos, a mídia local e também de diversas partes do Brasil vem apontando as fragilidades e as dificuldades dos hospitais públicos, especialmente aqueles das universidades, e aqui não tem sido diferente. O tom das notícias deixa nas entrelinhas que o serviço público não pode ter uma qualidade exigida pela população. Devemos deixar bem claro que devemos aperfeiçoar o modelo público, democratizando-o e aproximando-o das aspirações populares, e não simplesmente condicionando-o à lógica privada.
Os que defendem a privatização do Hospital das Clínicas criam um fato consumado, a saber: não há saída positiva no serviço público; depois apresentam a receita da salvação: adoção do sistema privado.
A EBSERH é como um portal para a universidade entrar para o mercado. Atrela-se a lógica da Saúde, da Pesquisa, da formação profissional e a sua Extensão à lógica empresarial. A meta é o lucro, o superávit, os ganhos.
Sob a lógica do público, diferentemente da EBSERH, a formação de profissionais da Saúde de qualidade e o atendimento ao público são centrais.
A qualidade do público é incompatível com os interesses da lógica empresarial! Não é por acaso que a própria EBSERH está sob a lógica privada, em seu primeiro artigo aponta: “(...) Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares - EBSERH, com personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio, vinculada ao Ministério da Educação(...)” (Lei 12.550/2011).
Sabemos que a Educação, a Saúde e a Seguridade Social são áreas que compõem um grande filão do mercado e, portanto, estão sob constante assédio. Vimos esse mesmo filme no passado e nos dias atuais com a existência contínua de leilões em áreas estratégicas de várias áreas: petróleo (capitaneados por uma empresa do estado brasileiro), aeroportos, portos, estradas, etc. É essa lógica que adentra nas universidades e na Saúde.
A missão de salvar os hospitais do caos, da EBSERH, é novamente um atalho ao enfretamento dos problemas dos Hospitais Universitários no Brasil. Políticas de apoio específico às pesquisas e ao funcionamento dos mesmos não necessitam de uma empresa. São necessários maiores recursos em conjunto com uma política nacional de valorização dos hospitais e de seus servidores e com a prioridade da formação de profissionais de Saúde.
A Autonomia
Para permitir a entrada da empresa na universidade deve-se ferir a autonomia da universidade! A Constituição Federal aponta claramente: “Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”. Como manter essa conquista e criar dentro da universidade uma empresa com as responsabilidades que vão de encontro a sua natureza social e jurídica?
Para os defensores da EBSERH não há outro caminho, senão unilateralmente o que eles propõem. Posição essa já contestada nos meios judiciais, por meio da ADIn 4.985 (Ação Direta de Inconstitucionalidade), promovida pela Advocacia Geral da União, por ser inconstitucional a entrada da empresa nas universidades. Para nós, a perda da autonomia é a perda da liberdade. Perder o controle do Hospital para uma empresa é o começo da perda de autonomia na área científica e da formação de profissionais na área da Saúde, e da universidade como um todo. A natureza da instituição universidade não se coaduna à natureza de uma empresa, mesma chamada de pública, pois a mesma reza pelo direito privado, regida pelas Leis da Sociedade Anônima.
A alma privada e perda de direitos
Sabemos que na justificativa original por parte do Governo Federal, a proposta da criação da EBSERH veio fundamentalmente em resposta ao sucateamento encontrado nos hospitais, especialmente no que tange ao déficit de 27 mil trabalhadores nos mesmos. A sociedade e o Tribunal de Contas da União exigiram uma saída a esse trabalho precário. A solução contra a terceirização dos serviços foi a criação inconstitucional de uma empresa “hospitalar-universitária”.
A EBSERH, como qualquer outra empresa, precisa diminuir os gastos com o pessoal. E para tal, aposta numa contratação mais barata, substituindo o Regime Jurídico Único (RJU) pela contratação através da CLT, apontando claramente a perda de direitos para os(as) trabalhadores(as) dos hospitais. Essa proposta fora derrotada em 2000, quando Bresser Pereira, na época Ministro de Estado, propôs que todos os professores das universidades fossem contratados através do regime público de emprego (CLT) e não pelo RJU. A entrada da EBSERH é uma reformulação prática nas carreiras públicas das universidades.
Ferir o regime estatutário das universidades é ferir a autonomia das universidades mais uma vez. Ao contrário da democratização, da valorização e responsabilização dos servidores, a direção colocada pela empresa é justamente o contrário: desvalorização dos servidores, pois serão contratados celetistas para empresa e não mais para os quadros da universidade; a responsabilidade de comandar fica cada vez mais externalizada aos que fazem o hospital; e, por fim, a eleição de seus diretores fica ainda mais longe de se efetivar. Ou seja, o processo democratizante necessário para a universidade e para a sociedade brasileira sucumbe aos interesses de uma empresa e seus dirigentes indicados pelo governo da época.
Na UFPE
O Conselho Nacional de Saúde já se posicionou contrariamente a EBSERH, junto com o ANDES-SN e a FASUBRA. A UFRJ está discutindo um processo de fortalecimento dos hospitais de forma autônoma. UFPR e UFCG rejeitaram a EBSERH em Conselho Universitário. Aqui na UFPE vamos continuar debatendo e firmando nossa posição em relação ao fortalecimento autônomo, comprometido com a população, com o Ensino, a Pesquisa e a Extensão em benefício da maioria da população brasileira.
Subscrevem este manifesto:
Atenágoras Duarte – CAA - UFPE
Bianca Queiroga - Presidente do Conselho Federal de Fonoaudiologia - CCS - UFPE
Daniel Rodrigues - Diretor do CE – UFPE
Elaine Amorim – Odontologia – CCS - UFPE
Heloísa Mendonça - Medicina Social – CCS - UFPE
Juliane Feix Peruzzo - Departamento de Serviço Social – CCSA - UFPE.
Lurildo Ribeiro Saraiva - Prof. Dr. Associado de Cardiologia, Departamento de Medicina Clínica, UFPE
Rafaella Asfora - DPOE – CE – UFPE
Rejane Dias - Primeira Secretária Regional NE - ANDES SN
Telma Ferraz - DMTE - CE - UFPE
Thiago Henrique - CAA - UFPE
Pessoal ...................voces querem mais adesões ou isso não importa ? Desde a ´rimeira vez que isso foi postado tento assinar e não consigo............
ResponderExcluirOi Mitz,
ExcluirEsta é uma das primeiras versões do Manifesto, que o pessoal do blog postou aqui. A próxima, vai estar com mais nomes, inclusive o seu, que é muito importante; todos são.
Esperamos coletar mais adesões até o dia 06 de dezembro!
Saludos, Daniel Rodrigues - UFPE