Radis amplia o foco do debate sobre o Aedes aegypti
A edição n. 161 de fevereiro de 2016 da Revista Radis, disponível on-line (clique aqui para acessar), destaca a tríplice epidemia viral de dengue, chikungunya e zica, doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti. “A possibilidade de alguns casos de zika evoluírem para complicações neurológicas como a síndrome de Guillan-Barré, e, desde novembro passado, a constatação de que a infecção pelo vírus durante a gravidez tem relação direta com uma outra epidemia, a de casos de microcefalia, entre outros comprometimentos da zika congênita, tornou a atual crise sanitária uma prioridade para além do campo da Saúde, acordando as autoridades e preocupando toda a população”, alerta o editorial da publicação.
A matéria de capa critica a ideia do mosquito como o “inimigo número um”, porque é mais eficaz modificar as condições que propiciam a proliferação do mosquito do que focar diretamente nele, afirmam pesquisadores e sanitaristas entrevistados. “O que permite a infestação dos mosquitos nas cidades brasileiras é a ausência de saneamento e de oferta contínua de água, acúmulo de lixo, falta de drenagem e de limpeza pública, falta de cuidados dentro e fora das casas para eliminar qualquer acúmulo de água parada.”
O editorial ainda acrescenta que o modelo “mata-mosquito”, utilizado com sucesso por Oswaldo Cruz no início do século 20, não dá conta da complexidade da realidade atual. É preciso deixar de usar veneno, fazer a limpeza e o saneamento ambiental de forma participativa, integrada e intersetorial, recomendam os especialistas.
Na matéria Aedes: ampliando o foco, Lia Giraldo, pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública da Fiocruz Pernambuco, disse que “enquanto o modelo de controle dessa doença complexa for centrada no vetor, como já é realizado há mais de 40 anos sem sucesso, não teremos possibilidade de solução”. Lia explica que, hoje, o Brasil é endêmico para dengue, com um vetor altamente competente para a transmissão nas áreas com alta densidade habitacional e baixas condições sanitárias, onde está o maior estresse hídrico e de pobreza.
De acordo com dados do Ministério da Saúde, em meados de janeiro, já eram 3.893 casos suspeitos da doença, notificados em 724 cidades de 21 unidades da federação. Para Rivaldo Venâncio, diretor da Fiocruz Mato Grosso do Sul, a epidemia de zika — cuja microcefalia é a consequência mais nefasta, mas não a única, tampouco a mais frequente — já pode ser considerada o mais grave problema de saúde coletiva, depois da violência, e a maior ameaça para as próximas décadas se não houver um aporte tecnológico de curto prazo.
Segundo a hipótese mais aceita, o Aedes aegypti chegou ao Brasil ainda no século 17, a bordo de navios que faziam o tráfico de escravos vindos da África. Os primeiros casos de febre amarela foram constatados nas cidades de Recife e Salvador, mas a primeira grande epidemia da doença só seria registrada dois séculos mais tarde, entre 1849 e 1850, atingindo quase todo o país. Naquela época, as teorias sequer associavam a febre amarela ao mosquito. Houve quem acreditasse que a culpa era do clima, do solo e do ar dos trópicos que favoreceriam o surgimento da doença.
Na opinião de Rivaldo, “nós perdemos essa luta de 7X1, como foi o jogo da seleção brasileira contra a Alemanha na Copa do Mundo do Brasil”. Ele acredita que o estilo usado para combater o Aedes é basicamente o mesmo que Oswaldo Cruz usou no início do século passado. “Isso foi bom naquele momento, mas hoje é insuficiente para o Brasil complexo que nós temos”. Rivaldo considera que estamos colhendo os frutos de um modelo de desenvolvimento excludente que vem sendo implantado no país há séculos. “Precisamos entender, de uma vez por todas, que, para combater o Aedes, é necessário repensar a forma como cuidamos do ambiente. Sem saneamento adequado, com o correto destino dos resíduos sólidos urbanos, sem abastecimento de água para consumo doméstico de forma regular e sem a redução da violência em muitas comunidades urbanas, não há como reduzir os índices de infestação desses mosquitos”, sugere. “Temos que refletir sobre a qualidade das cidades em que vivemos”, declarou à Radis.
Outra reportagem, Game Over para as doenças, trata dos jogos eletrônicos que podem auxiliar o processo de conscientização e prevenção na área da Saúde. Para a revista, aproximar as informações produzidas sobre prevenção e promoção da saúde do universo dos games pode estimular o debate público e a familiarização com temas relacionados à saúde, assim como auxiliar na conscientização de crianças, jovens e adultos para a adoção de hábitos mais saudáveis, assim como o enfrentamento de muitas doenças.
No Brasil, também há iniciativas interessantes, como o game Contra a Dengue: o jogo, criado pelo estudante de informática Renan Felipe Sousa, que busca conscientizar crianças sobre a formação dos focos da doença e orientar sobre o que fazer para impedir sua criação. Aluno do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA), campus de Altamira, no Pará, Renan criou um avatar que carrega um pulverizador para acabar com os mosquitos e recolher as garrafas, pneus e vasos com água acumulada. Após cada fase concluída, uma mensagem sobre o que fazer com o material recolhido aparece na tela. O sucesso da iniciativa fez com que a Secretaria de Saúde de Altamira estudasse a possibilidade de usar o software nas escolas de Ensino Fundamental.
*A partir de informações do ENSP