Publicado em 15/02/2016
Investigações realizadas pelo Tribunal de Contas do Município do Rio de Janeiro (TCM) elencaram uma série de irregularidades na gestão de grande parte das Organizações Sociais (OSs) que operam a rede de Saúde do município do Rio de Janeiro. Para Paulo Pinheiro, vereador e professor colaborador da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) , autor dos pedidos de auditoria ao TCM e de representações ao Ministério Público contra as OSs, problemas com sobrepreço de serviços e insumos, cobranças indevidas, pendências trabalhistas, atendimento ruim e gastos suspeitos comprovam que esse modelo não cumpre a determinação anunciada pelo prefeito da cidade na ocasião de sua apresentação (em 2009). “As investigações demonstram que o modelo não é mais barato, não é eficiente, não é eficaz, nem efetivo. Os problemas existentes na administração direta não foram resolvidos pela terceirização. Se o poder público tinha dificuldade na gestão dessas unidades, revelou ter falhas muito maiores na fiscalização e na regulação do modelo”, atestou.
O modelo de gestão da Saúde por OSs, que hoje está implementado em todas as regiões do país, teve início em 1998, no estado de São Paulo. Na cidade do Rio de Janeiro, as Organizações Sociais começaram a operar em 2009, com o lançamento do Programa Saúde Presente, que visava a expandir os serviços de Saúde a toda população da cidade. “Naquele momento, o prefeito enxergava as OSs como instâncias com maior flexibilidade para operar no Município e encaminhou à Câmara o Projeto de Lei 5.026, que dispõe sobre a qualificação de entidades como Organizações Sociais. As organizações eram vistas como um modelo de maior eficiência, eficácia e efetividade”, lembrou o professor colaborador da ENSP.
Para se ter uma dimensão dos gastos, o orçamento de 2015 da Prefeitura para a Saúde era de 4,5 bilhões. Desse total, 1,6 bilhão foi somente para as OSs. Em 2016, dos 4,9 bilhões de orçamento, 1,9 bilhão será para as Organizações. “Hoje, 40% do dinheiro da Saúde do Município é destinado às OSs. O modelo veio para o Rio de Janeiro sabendo da grande quantidade de dinheiro público destinado à Saúde”, informou o vereador, que contesta as indicações políticas e as falhas na supervisão. “A fiscalização, preconizada em lei, não é feita por profissionais habilitados na área, mas por profissionais escolhidos dentro das próprias unidades de saúde, sem qualquer conhecimento sobre a regulação”.
O controle externo, exercido pelo conselho municipal de saúde e pela câmara municipal, levou o vereador a pedir 35 auditorias, relativas aos 35 contratos das OSs. Em 16 auditorias recebidas comprovou-se irregularidades como desvio de dinheiro público e sobrepreços na compra de medicamentos e aquisição de serviços. Pinheiro lembra que as Organizações Sociais têm prerrogativa de não fazer licitação, logo, a teoria da flexibilização da gestão supõe a compra de medicamentos mais baratos que a administração direta. “No entanto, identificamos não só a compra de medicamentos, como também de material e insumos básicos, contratos de limpeza, segurança e alimentação com valores superiores. O aluguel de transportes foi a mesma coisa”.
“É preciso acabar com as indicações políticas”
Além disso, uma reportagem divulgada pelo jornal O Globo, no final de janeiro, denuncia despesas consideradas irregulares como gastos em churrascaria, táxis, passagens aéreas, taxas de administração e pagamento de profissionais sem que fossem apresentados comprovantes de atendimento. “Isso tudo demostra que o modelo não é mais barato e não é eficiente. Continuamos tendo filas, pessoas não conseguem marcar consultas ou fazer exames laboratoriais e de imagem. Encontramos filas nos CTIs nos hospitais e falta de profissionais nas Upas. Portanto, tudo aquilo que já era um problema na administração direta não foi resolvido, mas, agora, gasta-se mais dinheiro com isso”.
Ao ser questionado a respeito de alternativas para o modelo de gestão da Saúde no Município, o professor colaborador da Escola Nacional de Saúde Pública citou que as vantagens oferecidas às OSs deveriam ser dadas à administração direta. “Se o poder público tinha problemas como gestor dessas unidades, passou a ter problemas muito maiores como regulador, como fiscal. Estamos com um modelo que não é o melhor. O ideal seria oferecermos todas as vantagens dadas para as OSs à administração direta. É preciso manter o concurso público, oferecer um emprego estável e com um salário maior para o funcionário. É necessário um bom plano de cargos, carreiras e salários. A administração direta não vai bem porque não colocamos os melhores gestores nela. Novamente afirmo: é preciso acabar com as indicações políticas”.
No que diz respeito ao papel da Fiocruz, Paulo Pinheiro disse que a academia deve incorporar o assunto e aprofundar o debate por meio de pesquisas, sessões científicas e centros de estudos com a comunidade científica e a sociedade. Na Câmara de Vereadores, ele afirma que o prefeito vetou o projeto de lei que obrigaria as OSs divulgarem em suas páginas eletrônicas, de dois em dois meses, o valor dos contratos e citou outro projeto de lei, que tramita há seis anos na câmara, que revoga a lei das OSs e propõe uma outra legislação para o modelo de gestão da Saúde.
Prefeitura garante melhoras na fiscalização
A Prefeitura do Rio publicou, no dia 19 de Janeiro de 2016, 12 decretos que aprimoram a fiscalização dos contratos firmados pelo Município com Organizações Sociais (OSs) (clique aqui para saber mais). Entre as medidas, destacam-se a certificação em boa gestão, a criação do cargo de analista de contratos e convênios, o combate ao nepotismo, além da criação de mecanismos para evitar a prática de sobrepreço.
*Retirado do ENSP
Nenhum comentário:
Postar um comentário